05 dezembro 2005

Vinícius


Pegando a deixa histórico-musical de Coisa Mais Linda, de Paulo Thiago, o documentário Vinicius surge para contar em um zoom a história de Vinícius de Moraes, um dos poetas mais populares de todos os tempos. O longa de Miguel Faria Jr. (diretor de O Xangô de Baker Street), conta com um vasto material de pesquisa e muitas cenas filmadas no Rio antigo, praticamente despovoado, onde Vinícius nasceu.

O filme opta por intercalar ora entre interpretações na pele de Camila Morgado (certamente um tom acima do que desejaria o poeta) e Ricardo Blat de algumas das poesias mais famosas do boêmio, ora entre depoimentos de algumas das personalidades que tiveram contato com ele, ora entra números musicais (por vezes demasiado apelativos e globais, incluindo Zeca Pagodinho e um grupo rapper um tanto desconexo), e ora entre imagens de época (memoráveis os momentos em que Vinícius conversa entre amigos, com sua honestidade cômica típica).

O grande destaque vai para os depoimentos de Tônia Carrero, extremamente lúcida e tocante, e para Chico Buarque, descontraído, mas sempre inteligente e profundo. Outros entrevistados também fizeram relembrar a imagem do poeta com grande louvor, incluindo Maria Bethânia, Edu Lobo e Ferreira Gular, entre algumas de suas filhas. O interessante é que o filme evita defender um Vinícius perfeito, por mais que seja notável sua personalidade tranqüila e dadivosa.

Vinícius era, além de poeta, letrista, músico (um dos criadores da bossa nova) e diplomata, uma pessoa sempre em volta de paixões, mesas de bar, amigos e muito uísque (na definição do próprio ‘o cachorro engarrafado’, satirizando a máxima ‘o cachorro é o melhor amigo do homem’). Mas era também um sujeito conturbado, com numerosos casamentos e perplexidades de quem viu e inventou parte do Brasil.

Optando, assim como em Coisa Mais Linda, por intercalar entre câmeras digitais nas entrevistas e película no restante, o filme realiza uma autonomia e economia inteligente. Porém, muitas vezes se percebe certa insegurança nos enquadramentos e uso do zoom. Somado a isso, há algumas ameaças de perda de ritmo e um toque televisivo global bem nítido.

Exceto pelas entrevistas e gravações amadoras que mostram o próprio Vinícius, fica a impressão de que, no geral, houve uma perda significativa do clima nostálgico e cativante construído por Coisa Mais Linda. De qualquer forma, não parece haver qualquer dúvida quanto à importância do material como rica fonte de pesquisa sobre esse homem tão vasto.

P.S.: foi só eu ou alguém mais notou um certo desdém com o ceticismo, de uma forma geral? Ai, ai, ai...

Visto no NYCC, Rio de Janeiro
3 de dezembro de 2005